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Senhores passageiros, faremos a primeira paragem da nossa viagem, no sentido da visão, mais concretamente na variável Iluminação. Espero que esteja confortavelmente sentada/o no seu ambiente em estudo, tenha a lista e a caneta à mão, e sinta-se à vontade para experienciar o seu espaço com uma observação visual mais consciente.

“O que torna o nosso mundo visível e o que nos permite perceber o nosso entorno é a luz”. A luminosidade do ambiente que nos rodeia é produzida pela luz natural – provida pelo Sol e que penetra na pele- e pela iluminação – comummente luz artificial (velas, lâmpadas, leds…), designamos assim pois é absorvida pelo sistema visual e não pela pele-. Sabemos que o ser humano foi concebido para a luz natural e que a iluminação é um complemento da primeira. Deixando estes dois pontos claros, convido-vos a perceber cada um deles.

A luz natural regula o nosso ritmo circadiano, (isto significa “à volta de um dia”, que é como quem diz o nosso ritmo biológico), este ciclo é responsável pela segregação de hormonas e substâncias químicas no corpo, tais como, o cortisol, hormona ligada ao stress = diurna/ luz, e a melatonina, hormona ligada ao sono = noturna/ escuro, quando bem regulado tem um impacto muito positivo no bem-estar, produtividade, humor e sono.

Um estudo realizado pela OMS (Organização Mundial de Saúde), entre 2002/03, que visava saber “sobre o impacto da habitação no bem-estar físico e mental dos residentes”, abrangeu, entre outras cidades europeias, Ferreira do Alentejo, em Portugal. Esta sondagem, questionou se os inquiridos “haviam sentido falta de luz diurna no último ano” ou se “ligavam a luz num dia claro, porque a luz natural não chegava”. Apurou-se, então, que “quem se queixava de falta de luz natural em casa corre o risco de depressão”, por exemplo, “quem tinha depressão diagnosticada pelo médico apresentava mais de 40% de probabilidade de viver numa casa com falta de luz”.

Dá que pensar, certo?!

Fig.1- Imagem ilustrativa, iluminação natural, cor/temperatura, imagem encontrada no Pinterest, fevereiro, 2023

Com o advento da iluminação decorreram várias alterações tanto no comportamento humano, como na perceção e planeamento dos ambientes. Assim possibilita, no mesmo espaço criar atmosferas diferentes e complementares. Atmosferas que seduzem, que repelam ou acentuam a teatralidade ou dramatização. Provocam ou resfriam comportamentos. Isto tudo a partir das conjugações, posições, temperatura/cor da fonte luminosa e claro, das nossas sensações e perceções.

Já é do conhecimento dos profissionais que a luz mal projetada pode aumentar a sensação de dor, especialmente em espaços de saúde. Ou levar a maior número de compras, quando bem projetada num espaço comercial.

No entanto, os erros na hora de projetar iluminação continuam a surgir (e ninguém está livre de os cometer), um dos erros mais simples de identificar é a quantidade de luz que envolve um determinado espaço, ora é escassa, ora é ofuscante. E o problema neste âmbito, tem a ver com o facto de os utilizadores não estarem sensibilizados para ver e sentir o ambiente como um todo, entendem-no como separado (cores de parede, teto e pavimento; texturas; formas…), sem perceberem o quanto todas estas variáveis impactam no resultado.

Além disso, juntam-se algumas crenças que foram ensinadas ao longo do tempo. Por exemplo, a “luz amarela” deixa o ambiente muito quente”, então, as lâmpadas não são fonte de calor, não vão aquecer o ambiente, a sensação de calor provém da cor “amarela”. Também não é verdade, que a luz “branco frio” ilumina melhor o ambiente, mais uma vez tem a ver com a perceção sobre os espaços.

Fig.2- Imagem ilustrativa, iluminação artificial, cor/temperatura, imagem encontrada no Pinterest, fevereiro, 2023

O que eu sugiro é que em primeiro lugar perceba quais sentimentos, comportamentos e atividades que quer trazer para o seu ambiente, então depois, trabalhar a luz consoante o pretendido. Até porque, segundo Malcolm Innes, Professor e especialista em luminotécnica, “É tentador acreditar que simplesmente vemos aquilo que está diante dos nossos olhos. Mas a verdade é que vemos com os nossos cérebros, não com os nossos olhos”.

Por exemplo, quer acolhimento? Traga temperatura “quente”, talvez mais luzes de mesa e menos luzes de teto. Ou fazer uma conjugação entre ambas, tendo em vista o que definiu em primeiro lugar.

Agora, que está mais desperto, pegue na sua lista (onde anteriormente escreveu o que o seu ambiente lhe provocava) e responda às seguintes questões:

  • Como é a entrada de luz natural? (Quero que perceba uma coisa, a luz natural vai alterando a sua cor/temperatura no ciclo 24h aproximadamente. Assim, sabemos que a iluminação natural de um determinado ambiente vai mudar consoante a hora do dia. Aconselho-o a fazer este exercício de manhã, à tarde, final da tarde e à noite.)
  • Que tipo de luminárias existem? (teto? Parede? Mesa?)
  • Qual a temperatura/cor da lâmpada com mais influencia?
  • Quais são as cores da divisão? (cores claras refletem e cores escuras absorvem.)
  • À noite a iluminação exterior/ pública entra nos seus ambientes? (se for num quarto é importante criar uma estratégia para que isso não aconteça.)
  • Como me sinto com a iluminação deste ambiente? Como me sinto com o ambiente escuro?

Porque é que é importante responder a estas questões? Posicionamento de equipamentos, por exemplo, onde será mais estratégico colocar a secretária do escritório. Quantidade de luminárias e onde são mais estratégicas. Conjugação de temperatura de luz, se assim fizer sentido. Até porque um estudo efetuado em ambiente escolar, no Japão, sugere que “existe maior produtividade na aprendizagem quando a iluminação é branca neutro”, já as “atividade recreativas e sociais são potencializadas quando a iluminação é branca quente”.  E como é óbvio, trazer mais bem-estar e poupar na conta da eletricidade.

Algumas estratégias que pode implementar:

  • de manhã cedo abrir os estores da sua casa e deixe entrar a luz (sempre que possível abra a janela para arejar o espaço);
  • pode usar dois tipos de cortinas, uma de tecido mais transparente e outra de tecido mais opaco;
  • colocar luminárias de mesa e/ou chão para criar “ilhas de iluminação” e acrescenta mais acolhimento.
Fig.3- Projeto de design de interior, Casas de Gerei, Marta Pedreira d.er, julho, 2021

Acredito, que agora está mais sensível a este “tema tão luminoso” e que vai querer continuar a viagem. No próximo artigo, continuaremos confortavelmente no sentido da visão. Consegue adivinhar qual o próximo tema?

Conto consigo nesta viagem. Até breve!

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Designer de interiores. Designer Executiva, Jordi Studio Design. Formação em Neurociências aplicada à Arquitetura, com enfase em espaços de saúde. Membro da Academia Brasileira de Neurociência e Arquitetura.

2 comentários

  1. Tenho seguido atentamente o seu trabalho, e deixe-me que lhe diga que em todos os artigos por si escritos, fico sempre com a mesma sensação. Que queria continuar a ler mais.
    É importante que realmente a nossa habitação se transforme num espaço em que nos sintamos bem, e as vezes os pequenos pormenores fazem realmente a diferença.
    Obrigado por nos ensinar isso.

  2. Agradeço, Bruno. Todos os conhecimentos que transmito ou pelo menos tento transmitir, são fruto de muito emprenho e estudo.
    Agradeço uma vez mais pelo feedback, espero que continue a acompanhar-me nesta viagem.

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