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Se a nossa viagem pelos sentidos tivesse uma playlist, neste momento, as escolhas poderiam ser “La vie en rose” de Edith Piaf, “Yellow Submarine”, dos The Beatles ou até “Back in Black” dos ACDC. Além de serem músicas memoráveis, têm em comum a utilização da nomeação de uma cor para expressar de forma mais emotiva os sentimentos associados à letra e melodia.

A primeira canção fala-nos de amor e usa o rosa para enaltecer a sua mensagem – a cor do amor é o rosa-, a segunda tem uma melodia mais alegre e adota a cor com mais sorridente de todas, o amarelo, a cor da alegria. A última ligada ao rock, às batidas pesadas e cheias de personalidade e irreverência,  o preto é a melhor cor para representar estas atitudes. Claramente, a nossa paragem de hoje, será dentro do sentido de visão, na variável cor.

Para existir a “produção do fenómeno colorido” é necessária a existência da luz e do olho e claro, de uma superfície para a sua reflecção. Assim, a cor é produzida no órgão da visão pela ação da luz. O olho humano vê um número reduzido de cores, são aquelas que vemos no arco íris. No entanto, à medida que vamos nomeando mais tons, como por exemplo, “azul noite”, “azul-marinho”, “azul pastel” – só o azul tem 111 tons– o nosso cérebro consegue ter a perceção de um “leque mais amplo de cores” (nós só vemos aquilo que conseguimos nomear).

Sabemos, ainda, que as cores participam na construção da personalidade, imprimindo muitos mais aspetos inconscientes do que conscientes, isto porque o cérebro está constantemente a captar informações do ambiente, traduzindo em sensações, por exemplo, de conforto, segurança ou sobrevivência. Considera-se, ainda, que as cores que associamos na nossa infância a um determinado sentimento e emoção, acompanham-nos ao longo da nossa vida.  

Assim, o mesmo sentimento/cor conectados na infância, provavelmente serão os mesmos quando adultos.

Gostaria de partilhar consigo algo pessoal que ilustra na perfeição o supracitado. Se me conhece, deve saber que me visto maioritariamente de preto, contudo a minha cor favorita é o vermelho –cor que uso muito raramente-. Mas porque é que gosto tanto de preto?

Pessoalmente, o preto é a cor mais feliz de todas, a mais colorida, pois para mim está associado a memórias de infância muito felizes. A história: passei a minha infância ao lado da minha bisavó Helena, ela foi – continua a ser- das melhores pessoas que conheci até aos dias de hoje. Pequenina, rechonchuda e um riso tão acolhedor que, ainda hoje, ressoa e encanta a minha memória. Confesso que, ainda, consigo ver aquela pequena mulher vestida de preto a esticar as mãos pequenas para segurar as minhas. Assim, desde o momento em que comecei a escolher a roupa que queria vestir, decidi optar pelo preto, porque esta cor evoca a minha experiência pessoal de acolhimento, segurança e amor (geralmente, na psicologia da cor, nenhum destes sentimentos é traduzido ou associado ao preto, pois está conectado ao polo negativo e quando conjugado com outra cor, ressalta-lhe as suas características negativas -por exemplo, preto + vermelho = ódio).

Memórias de infância, bisavó Helena e Marta, Giela, 1993. “Se eu descrevesse esta memória, diria o “principio de tudo”.

Desta forma, o que pretendo explicar é que não podemos ver a cor só com os olhos, é preciso vê-la com o cérebro e compreender o seguinte “a atitude de alguém frente à cor é afetada e modificada pelo meio/ ambiente em que vive, cresce, é educado, a sua idade e temperamento. A preferência por determinada cor é relativa”. As cores mexem ou exercem forças a nível psicológico, biológico, físico e cultural. Criam identidades, geram valores.

Por exemplo, se pensarmos em África, pensamos nos padrões coloridos, se for em Marrocos, chegam-nos as cores das especiarias (o cheiro também, mas explicarei sobre este sentido, noutro dia), se alguém nos falar em Istambul, vem à memória as cúpulas azuis das Mesquitas.

Então de que forma podemos aplicar a cor nos nossos ambientes?

Primeiro é uma questão de auto perceção, “quem sou eu?”, “o que quero sentir?”, “o que quero vender?” – caso aplique a um negócio-, “como posso ser mais produtiva/a?” – se for um escritório-, (acredite não vale a pena pensar, apenas, “qual é a minha cor favorita”, porque acredite, é o inicio para uma receita de insucesso). Questionamos, ainda, se nos sentimos melhor com cores quentes ou frias. Posteriormente, analisamos o nosso ambiente quanto:

  • à luz natural e iluminação (sem luz, não há cor);
  • dimensões;
  • formas e texturas.

Vamos ver um exemplo, “quero sentir leveza”. Pessoalmente, planearia um ambiente em tons verde, podia colocar tons rosa seco, quase terracota, porque preciso de tons quentes para me sentir bem. Deixaria de lado os azuis e beges, porque não me sinto acolhida e confortável com estes tons. Muito provavelmente, outra pessoa poderia escolher tons brancos e apontamentos em tons pastel ou a utilização do azul, porque lhe faz lembrar a leveza do mar.

Aplique a regra 60; 30;10, isto é 60% cor dominante, 30% cor secundária, 10% cor de destaque.

O que aconselho caso queira começar a utilizar cor, comece por uma base branca e vá adicionando tons quentes ou frios, aqui depende do que sente ou quer sentir, em apontamentos que sejam fáceis de trocar, almofadas, mantas, jarras ou flores.  

Quero que saiba que na utilização da cor nada é proibido, é tudo uma questão de equilíbrio, harmonia, experiência e valores. Como diria Veca Avelar, “Sem luz não há cor, sem cor não há vida, sem vida nada importa e sem porta não há saída”.

Agora ouça a playlist que sugeri no início, porque a próxima pagarem será no sentido da audição.

Até Breve!

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Designer de interiores. Designer Executiva, Jordi Studio Design. Formação em Neurociências aplicada à Arquitetura, com enfase em espaços de saúde. Membro da Academia Brasileira de Neurociência e Arquitetura.

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